A hidrologia desfavorável no início da atual temporada de chuvas reacendeu a polêmica em torno da necessidade de racionamento de energia em 2015. Uma nova rodada de informes que circulam no mercado financeiro vê como altas as chances de medidas para forçar redução do consumo se não houver rápida melhoria no nível dos reservatórios.
Cinco bancos - J.P. Morgan, Itaú Unibanco, Credit Suisse, BTG Pactual e UBS - divulgaram relatórios com alertas aos clientes sobre a situação. Enquanto isso, as usinas térmicas bateram quatro recordes seguidos de produção desde a semana passada e geradores têm recebido pedidos para evitar manutenções programadas durante o pico do verão, quando as altas temperaturas fazem disparar a demanda nos horários de ponta e podem colocar em risco a segurança do sistema.
Se o volume de chuvas repetir o padrão observado em qualquer um dos últimos três anos, segundo o Itaú, os reservatórios das hidrelétricas chegarão a abril de 2015 ainda mais baixos do que em igual período deste ano, o que exigiria a adoção de medidas. "Podemos avaliar que um nível agregado abaixo de 50% em 30 de abril de 2015 mantém uma situação de riscos, enquanto um nível abaixo de 40% possivelmente levaria a algum tipo de programa de redução do consumo de energia", afirma o banco, em relatório assinado pelos especialistas Artur Manoel Passos e Pedro Artur Coelho. Neste ano, os reservatórios estavam com 42,6% de sua capacidade máxima no fim de abril, quando se encerra oficialmente o período chuvoso.
Para o J.P. Morgan, mesmo com crescimento zero da demanda e térmicas funcionando a todo vapor, um racionamento pode ser decretado nas primeiras semanas de 2015, caso as chuvas de novembro e dezembro fiquem abaixo de 70% da média histórica. "Se o sistema registrar uma hidrologia fraca até janeiro de 2015, tendemos a acreditar que medidas heterodoxas seriam necessárias para restringir o consumo de energia", observa o relatório, assinado pelos analistas Marcos Severine e Henrique Peretti, especialistas no setor elétrico.
Até agora, em novembro, a vazão que tem chegado aos reservatórios foi de apenas 61% da série de 84 anos nas regiões Sudeste e Centro-Oeste - onde estão as maiores caixas d'água do país. No Nordeste, segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a vazão está em 34% da média. As primeiras projeções oficiais para a hidrologia de dezembro serão divulgadas até amanhã.
Se as chuvas forem ruins nas próximas semanas, o J.P. Morgan diz que seria preciso fazer um corte de 6% a 7% da carga total para evitar o esvaziamento de reservatórios e blecautes no ano que vem. Com um racionamento de tal intensidade, seria possível chegar a novembro de 2015 com os reservatórios a 14% da capacidade máxima no Sudeste/Centro-Oeste e a 8% no Nordeste, considerando um volume de chuvas equivalente a 70% da média histórica e estagnação da demanda.
O J.P. Morgan indica, no entanto, que essa não é a tendência com a qual está trabalhando. Para o banco, que diz ter feito "vários encontros" com institutos de meteorologia, o cenário-base é de chuvas perto de 85% da média em 2015. Comessa hipótese, as represas chegam ao fim do próximo ano com 31% e 24% do armazenamento máximo, respectivamente, o que não exigiria racionamento, apesar dos níveis ainda serem críticos.
Para o UBS, se as precipitações mantiverem o padrão verificado desde o início da estação chuvosa, pode haver problemas. "Se as chuvas continuarem nos níveis atuais, isso implica alto risco de racionamento", comenta a analista Lilyanna Yang, em relatório publicado no começo da semana.
Entre tantas incertezas, a geração de energia térmica bateu um recorde histórico na sexta-feira passada: as usinas movidas a gás, óleo e carvão - além das duas centrais nucleares de Angra dos Reis (RJ) - produziram 17.068 megawatts médios. Em novembro, houve quatro dos cinco maiores registros de acionamento das térmicas em todos os tempos. O engenheiro e consultor Humberto Viana Guimarães, que compilou os dados, demonstra preocupação: "A qualquer momento poderá haver um apagão de proporções nacionais".
Na tentativa de reforçar o sistema com todos os megawatts possíveis, o ONS tem conversado informalmente com donos de térmicas para que evitem manutenções programadas durante o verão. Há preocupação com o atendimento da demanda no horário de ponta.
A orientação tem sido, como de costume, respeitar fielmente os cronogramas de paralisação das máquinas para verificação dos equipamentos. Mas, diante da necessidade de estar com todo o parque térmico à disposição no pico do calor, antecipar ou adiar paralisações que não são consideradas indispensáveis do ponto de vista da segurança.