Gasto da indústria com energia deve crescer 47%

A grande indústria prevê um aumento em torno de R$ 20 bilhões nos gastos com eletricidade até 2018. O montante deve elevar em 47% a fatura paga atualmente pelo setor, conforme estimativas feitas pela Abrace, entidade que representa consumidores industriais de energia.


Em levantamento recém-concluído com seus 46 associados, que respondem por uma demanda de aproximadamente 10 mil megawatts (MW) e 40% do consumo industrial, a Abrace aponta o vencimento de contratos antigos como principal razão para a disparada de gastos com o suprimento de eletricidade nos próximos quatro anos. Quase todas as grandes empresas do setor estão no mercado livre, onde têm liberdade para negociar com qualquer fornecedor, sem a obrigação de comprar energia das distribuidoras. "Os contratos novos vão sendo contaminados pelo cenário de preços mais altos", diz o presidente da associação, Paulo Pedrosa.

Segundo ele, a maioria das indústrias trabalha com um horizonte de longo prazo - duração média de cinco anos dos contratos de fornecimento - para se livrar das flutuações do mercado "spot", onde o valor do megawatt-hora se manteve em patamar elevado nos últimos meses. O problema é que, nas circunstâncias atuais, não tem mais sido possível à indústria renovar contratos perto do vencimento sem enfrentar aumentos dolorosos. "Os preços médios estão subindo de R$ 130 para uma faixa de R$ 180 a R$ 200 por megawatt-hora", diz Pedrosa.

Só em 2015, a Abrace calcula que a conta subirá R$ 5,5 bilhões. Fontes do mercado afirmam que fabricantes de ferro-liga em Minas Gerais estão entre os mais afetados. Indústrias na região teriam mais de 500 MW em contratos prestes a expirar, com a Cemig, nos quais hoje pagam apenas US$ 27 por megawatt-hora.

O presidente da comercializadora Trade Energy, Walfrido Ávila, relata que novos contratos de suprimento por um período de cinco anos estão sendo fechados por R$ 200 o megawatt-hora. Para o fornecimento por 12 meses, cobrindo todo o ano de 2015, o valor alcança até R$ 350. Diante do cenário desfavorável, ele afirma que a prioridade da comercializadora tem sido renovar contratos próximos do vencimento, mas houve até recusa de novos clientes por causa da escassez de eletricidade.

Ávila ressalta que medidas recentes do governo provocaram um enxugamento da oferta de energia no mercado livre e, como consequência, a disparada de preços, independentemente da estiagem mais severa. O empresário cita o leilão emergencial promovido em abril deste ano. Para reduzir a exposição involuntária das distribuidoras, o governo fixou uma tarifa-teto relativamente alta - R$ 271 - no certame, que era capaz de seduzir as geradoras. A estratégia deu certo e muita gente que tinha energia disponível fechou contratos com as distribuidoras que duram até 2019. O lado perverso da história é que diminuiu a oferta para consumidores livres.

O maior desequilíbrio apontado pela indústria, no entanto, é a MP 579. Convertida posteriormente na Lei 12.783, a medida provisória estendeu por 30 anos as concessões de usinas hidrelétricas e viabilizou a redução de 20% nas contas de luz dos consumidores residenciais. A queixa da indústria está no fato de que toda a energia barata de usinas já amortizadas foi entregue, em regime de cotas, às distribuidoras.

Em 2015, mais usinas - hoje operadas pelas estatais Cemig, Cesp e Copel - voltam às mãos da União. Comisso, um volume adicional de eletricidade será alocado para as distribuidoras. "A entrada de novas cotas enxugará ainda mais a oferta no mercado livre. Isso é injusto porque todos os consumidores, industriais ou residenciais, pagaram pela amortização dessas usinas e deveriam ter direito a um pedaço da energia mais barata", afirma Pedrosa.

Procurado pelo Valor, o Ministério de Minas e Energia informou que desconhece o levantamento da Abrace e preferiu não se pronunciar, mas observou: "O governo não interfere na atuação de empresas no mercado livre, que tem suas próprias regras".

Outro fantasma que aflige a indústria é o fim, em junho de 2015, de um contrato entre a Chesf e um grupo de sete pesos-pesados com operações no Nordeste. Gerdau, Braskem, Vale, Dow, Ferbasa, Paranapanema e Mineração Caraíba compram eletricidade por R$ 110 o megawatt-hora. O contrato prevê o fornecimento de 700 MW.

Com a renovação das concessões de hidrelétricas da Chesf, essa energia passará para o suprimento das distribuidoras. Desde meados do ano, emendas foram incluídas, sem avanços, em diversas medidas provisórias, na tentativa de permitir uma extensão do contrato com as indústrias.

Em ofício enviado em agosto ao secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, as federações das indústrias da Bahia (Fieb) e de Alagoas (Fiea) afirmam que "a interrupção desses contratos terá graves consequências para a economia da região, principalmente no que tange à descontinuidade de investimentos e geração de emprego, renda, impostos e divisas".

Zimmermann, em entrevista recente ao Valor, fechou as portas para uma mudança na legislação que permita a extensão do contrato entre Chesf e indústrias do Nordeste. "Se mudar no Nordeste, as indústrias do Sul e do Sudeste também vão querer. A lógica é a mesma", concluiu o secretário.

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