Fontes renováveis geram até 100% da eletricidade no Uruguai.

Há apenas 15 anos, o Uruguai tinha grande dependência externa na geração de energia. O petróleo representava 27% de todas as importações e um novo gasoduto iniciava operação, trazendo gás da Argentina. Através de um processo decisório firme e parcerias público-privadas essa realidade se transformou rapidamente. “Há 3 anos que não importamos um único quilowatt-hora”, diz Rámon Méndez, diretor do Sistema Nacional de Resposta ao Câmbio Climático. “Estávamos habituados a importar eletricidade da Argentina, mas agora exportamos para eles. No último verão vendemos 1/3 da nossa produção de energia para eles”. Hoje em dia o Uruguai chega a alcançar 100% de produção de energia elétrica proveniente de fontes renováveis.


Ainda há muito a se fazer. O setor de transportes, por exemplo, continua dependente do petróleo. Mas a indústria – sobretudo a de processamento agrícola – é predominantemente abastecida por usinas de cogeração por biomassa. Nesse processo não existem milagres tecnológicos envolvidos. Além disso, energia nuclear está totalmente ausente do mix de fontes energéticas e não foi instalada nenhuma nova hidrelétrica nas últimas 2 décadas. Nos últimos 5 anos o investimento em energia no Uruguai – principalmente as renováveis, mas também em gás liquefeito – subiu para US$7 bilhões, ou 15% do PIB uruguaio. Esse valor é 5 vezes maior que a média na América Latina, ou 3 vezes maior que a recomendação internacional feita pelo especialista em economia climática Nicholas Stern.

Bom mix de fontes

Biomassa e energia solar também estão em ascensão. Somando isso às hidrelétricas já existentes, a energia proveniente de fontes renováveis responde por 55% de toda energia usada no país – incluindo combustível para veículos – o que coloca o Uruguai bem à frente da média global de 19,2%. Comparando com outros pequenos países com elevados percentuais de fontes renováveis de energia, o mix uruguaio é bem diversificado.

Enquanto Paraguai, Butão e Lesoto confiam basicamente em hidrelétricas e Islândia em geotérmicas, o Uruguai tem uma variedade de fontes que torna menos vulnerável a alterações no clima. Parques eólicos alimentam usinas hidrelétricas de maneira que as barragens podem manter suas reservas por mais tempo depois que passa o período das chuvas. De acordo com Méndez, isso reduziu a vulnerabilidade a secas em 70% – o que não é um benefício pequeno considerando que um ano de chuvas escassas costumava custar ao país cerca de 2% do seu PIB. Confirmando seu compromisso com sustentabilidade, o governo uruguaio afirmou, em convenção da ONU, que reduzirá suas emissões de carbono em 88% até 2017 (em relação ao período de 2008 a 2012). Com a instalação recente de novos parques eólicos, não há dúvidas de que alcançarão a meta.

Mudanças são nítidas

Toda essa transformação se torna visível atravessando a Ruta 5, umas das principais estradas do Uruguai, que corta todo o país, desde Montevidéu ao sul até Rivera, na fronteira com o Brasil. Em menos de 300 quilômetros você passa por 3 usinas de biocombustíveis e mais 3 parques eólicos. O maior deles é o Peralta, uma usina de 115MW, construída e operada pela empresa alemã Enercon. Suas turbinas gigantescas – cada uma mede 108 metros de altura – se erguem sobre pastagens ocupadas por gados e emas.

Além da região com ventos constantes – média de 12km/h – o maior atrativo para investidores estrangeiros como a Enercon é um preço fixo por 20 anos garantido pelo órgão público. Como o custo de manutenção é baixo (são necessários apenas 10 empregados) e estável, isso garante o lucro.

A consequência é que várias empresas estrangeiras estão interessadas em garantir contratos para operação de usinas eólicas. E a concorrência está causando queda nos preços das propostas, reduzindo os custos de geração de eletricidade em mais de 30% nos últimos 3 anos. Christian Schaefer, supervisor técnico da Enercon disse que sua companhia tem perspectivas de expansão e uma outra empresa alemã, a Nordex, já está construindo uma usina ainda maior mais ao norte na Ruta Cinco. É comum ver caminhões carregando turbinas, torres e hélices pelas estradas do país.

Méndez atribui o sucesso uruguaio a três fatores-chave: credibilidade (uma democracia estável que jamais declarou moratória de suas dívidas é atrativa para negócios a longo prazo); condições naturais favoráveis (bons ventos, radiação solar decente e muita biomassa proveniente da agricultura); e fortes estatais (que são parceiros confiáveis para as empresas privadas e podem trabalhar junto ao estado para criar um ambiente propício à operação).

O reconhecimento internacional não demorou a chegar: a revista Fortune mencionou o nome de Ramón Méndez na sua seleta lista de líderes globais e o WWF incluiu o Uruguai no seu relatório “Green Energy Leaders” (algo como Líderes em Energia Limpa) de 2014 afirmando que o país está criando tendências globais de investimento em fontes renováveis de energia.

Em terras brasileiras

Aqui no Brasil temos bons índices se compararmos com as médias mundiais, mas considerando todo o nosso potencial, ainda precisamos aprender muito com os vizinhos uruguaios. Principalmente porque concentramos a produção em hidrelétricas, que causam grande impacto ambiental e são mais vulneráveis a alterações climáticas.

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