A geração de energia em casa a partir de fontes renováveis, especialmente a solar, é um caminho sem volta no Brasil. Em 2012, existiam três conexões domésticas no país. Hoje, são mais de 3,5 mil sistemas instalados e, até 2024, 1,2 milhão de brasileiros produzirão a própria energia. Mas a consolidação desse modelo precisa superar alguns desafios, entre eles, a “briga” com as distribuidoras, que não estão dispostas a perder mercado.
Desde 1º de março, quando a nova resolução para a geração distribuída passou a vigorar, o consumidor de energia pode ser também fornecedor. Além de economizar na conta de luz, quem tem um sistema de mini ou microgeração pode também compartilhar a energia excedente com a rede. “Com as redes inteligentes, a pessoa assume a função de ‘prosumidor’, porque passa a não só depender da rede tradicional, como também a alimentá-la com o que produz”, resume Claudio Lima, consultor internacional do programa de Redes Elétricas Inteligentes (Smart Grid) do Governo Federal.
Mas, para que o trânsito energético entre usuários e concessionárias ocorra com eficiência, são necessários investimentos nas redes. A inovação custa caro e incertezas sobre como os aportes feitos pelas companhias podem ser recuperados, além do medo de perder mercado, já motivam discussões e podem render polêmica.
Quando a energia é produzida no ponto de consumo, o usuário se torna mais independente de grandes centrais de abastecimento e da rede tradicional de distribuição. Nesse modelo, a porção energética produzida por uma mini ou micro unidade geradora é lançada ao sistema e distribuída a outros usuários. O produtor, por sua vez, acumula o que ofertou em créditos, transformados, na sequência, em descontos na conta de luz. Em um cenário ideal, ele pode chegar a pagar como conta um valor próximo à tarifa de disponibilidade da rede, que varia entre R$ 15 a R$ 30, dependendo da concessionária.
Distribuidoras descontentes
Para Nelson Fonseca Leite, presidente da Abradee (Associação Brasileira das Distribuidoras de Energia), a resolução atual em nada favorece as concessionárias de energia e precisa ser revista. “O sistema não é sustentável do ponto de vista econômico. O pagamento de valores próximos à tarifa de disponibilidade onera a operação das redes e desconsidera que o usuário utiliza toda essa conexão para distribuir energia quando não a utiliza”, diz. A solução, segundo a entidade, seria a cobrança da tarifa binômia. Por meio dela, o “prosumidor” pagaria pela energia que aproveita da rede, mas também pelo uso da estrutura.
“Hoje, a distribuidora não só perde receita como, quando houver revisão tarifária, fica obrigada a repassar o aumento aos usuários que não têm sistemas de produção energética doméstico. Quando o mercado crescer, as distribuidoras podem quebrar e essa responsabilidade teria de ser assumida pela Aneel”. Atualmente, o Brasil conta com 77 milhões de unidades consumidoras.
Hugo Lamin, da superintendência de Regulação dos Serviços de Distribuição da Aneel, explica que o modelo adotado no Brasil é o mesmo que vigora em outros 51 países. Entretanto, a agência se compromete a revisar o regulamento em 2019. “Até lá, o país deve contar com 500 mil unidades com geração própria e reavaliaremos as normas para discutir modificações e evitar prejuízos a consumidores e distribuidoras”.
Enquanto a tarifa binômia não é considerada, a Abradee entrou com um recurso na Aneel pedindo que a agência contabilize e ressarça as concessionárias pelas perdas financeiras que já ocorrem. O pedido ainda não foi julgado.
Desafios nacionais
Outros desafios ainda limitam a expansão da mini e micro geração distribuída no Brasil. Veja os principais:
•Cobrança de ICMS
Não são todos os estados brasileiros que conferem isenção na cobrança do ICMS sobre a energia produzida por fontes renováveis. O Paraná, por exemplo, ainda não tem previsão para fornecer a isenção do tributo.
•Importação de componentes
Por enquanto, apenas a montagem dos módulos solares costuma ser feita no Brasil. A maior parte dos componentes é importada de países como China ou Alemanha. Com ampliação de pesquisa e domínio da tecnologia das empresas nacionais, os sistemas tendem a ficar mais em conta.
•Burocracia dos financiamentos
A maior parte das linhas de financiamento para compra de sistemas concedidos por bancos como Caixa Econômica e Banco do Brasil, atendem consumidores residenciais ou proprietários de pequenos estabelecimentos. As taxas praticadas costumam não ser tão viáveis para grandes empresas, que dependem do apoio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) ou de outras instituições financeiras, como o BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul) e Banco do Nordeste, por exemplo. Eles já oferecem condições mais vantajosas para o pagamento de estruturas maiores. Para Paulo Cunha, consultor da FGV, a morosidade de algumas aprovações ainda dificulta a adesão pelos sistemas por muitas empresas. “O tempo de análise do crédito até a liberação do recurso por alguns bancos pode chegar a 12 meses. Agilizar o processo facilitaria muito”, defende.
•Mão de obra qualificada
A necessidade de qualificar profissionais para trabalhar no setor é outra necessidade. Segundo estimativas da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR) e da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), considerando as perspectivas atuais de crescimento, até 2020,340 mil empregos diretos e indiretos podem ser gerados no Brasil somente pelas áreas fotovoltaica e eólica.
Mais autossuficiência
Veja como avança o índice de unidades geradoras de energia no Brasil:
Fonte: Redação. Infografia: Gazeta do Povo
Nenhum comentário:
Postar um comentário