MME diz que fonte tem espaço garantido na expansão do setor elétrico, com papel relevante nos próximos leilões

Se os cerca de 3 GWp em energia solar fotovoltaica já leiloados no país ainda trazia incerteza sobre o interesse do governo em incentivar a fonte, a posição da nova equipe do setor elétrico tenta reverter a situação e não deixou mais dúvidas de que a hora chegou no Brasil. A fonte quer repetir o case de sucesso da eólica, se tornando competitiva e atraindo a cadeia produtiva para o país. Mas ela tem um diferencial quando comparada a qualquer outro recurso de geração viável hoje no país: sua enorme vocação para a geração distribuída. De longe, a solar é a mais utilizada entre as formas de geração descentralizada, permitindo até que consumidores residenciais produzam a sua própria energia e a preços competitivos.

Claro que o investimento inicial para se ter um painel solar em casa ainda é alto para a maior parte da população. Mas, a perspectiva é de que isso fique cada vez mais barato, entrando na realidade dos brasileiros. Uma das formas de se baratear essa forma de geração é o governo dar incentivos. E isso não deve faltar. O ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, esteve presente ao Brasil Solar Power 2016, e deixou claro o compromisso do governo com as energias renováveis e com a geração de empregos. O evento, realizado pelo Grupo CanalEnergia e a ABSOLAR, aconteceu entre os dias 30 de junho e 1° de julho, no Rio de Janeiro, reunindo mais de 1.500 participantes

Segundo ele, a energia solar tem espaço garantido na expansão do setor elétrico e terá papel relevante nos próximos leilões. Em 2016, o governo deverá estruturar apenas mais um leilão de geração, devido a sobrecontratação das distribuidoras. "Nós teremos sim um leilão de energia ainda neste ano, nós teremos sim uma participação relevante para a solar fotovoltaica nos próximos leilões. Mas eu sou muito transparente, antes de contratarmos novas energias tem alguns problemas que temos que estar endereçando enquanto ministério, o diagnóstico está quase pronto, algumas medidas já estão sendo tomadas sobretudo, como todos vocês sabem, a respeito da sobrecontratação", disse o ministro.
Coelho lembrou ainda as metas ambiciosas assumidas pelo Brasil na COP-21, em relação ao crescimento das energias renováveis não hídricas, principalmente, eólica e solar. "O compromisso e o apoio a energia renovável é um compromisso da minha geração, que tem um compromisso com as fontes de emissão de baixo carbono, por isso, estamos estudando uma política energética que possa sinalizar isso de forma muito clara", adiantou ele, acrescentando que isso inclui uma "política industrial que possa dar isonomia tributária" a fonte solar e estimular a indústria nacional.

O estímulo a indústria é justamente o foco de um acordo de cooperação que foi assinado no evento entre a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica e a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial. A ideia é aumentar a competitividade da cadeia produtiva da energia solar fotovoltaica no país, assim como atuar no combate à questões que possam representar gargalos para o desenvolvimento da fonte. Por meio da parceria, serão implementadas ações para que o Brasil possa se tornar um polo de desenvolvimento industrial em energia solar fotovoltaica. O presidente da Absolar, Rodrigo Sauaia, conta que uma das propostas que será levada à ABDI é a de se realizar uma análise da cadeia produtiva, assim como foi feita com a cadeia da energia eólica. Segundo Sauaia, esse mapeamento preliminar pode trazer informações relevantes como volume de empregos, investimentos aplicados que poderão chegar nos próximos anos, bem como a capacidade de entrega de equipamentos. Isso, acrescentou ele, tanto para o fornecimento de materiais elétricos, módulos, inversores, estruturas e até mesmo em serviços, um setor da economia que a solar gera valor.

Para alimentar essa cadeia, o presidente do Conselho de Administração da Absolar, Nelson Colaferro, pediu ao governo a contratação de 2 GW da fonte por ano nos leilões de energia. Além disso, ele pediu a criação de bases para a instalação de um milhão de telhados fotovoltaicos até 2024. "O que vai definir se a energia solar vai deslanchar mesmo ou não são os sinais claros que o governo está dando aos investidores que querem desenvolver a fonte no país", afirmou Colaferro. No entanto, o secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do MME, Eduardo Azevedo, disse que ainda não é possível indicar quando esse volume de contratações ocorrerá, apesar de o MME ter a consciência de que existe essa necessidade de volume para o setor deslanchar.

Para o ministro Fernando Coelho, o segmento de geração solar é fundamental para a matriz energética brasileira e novas formas de incentivar o setor devem ser perseguidas, para que o segmento não fique dependente apenas dos leilões. “O Brasil compete com outras oportunidades, não há sol só no Brasil, o sol existe em muitos outros países. Se não criarmos um ambiente mais competitivo, mais favorável, o recurso encontra rentabilidade em outro local e isso é tudo que não queremos nesse momento”, disse o ministro. 
O deputado Fábio Garcia (PSB-MT) destacou que o segmento de energia solar já é uma realidade dentro da matriz energética brasileira. No entanto, para ele, para se avançar ainda mais, o ideal é que sejam realizados leilões anuais e por fonte. "Assim, os investidores poderão fazer seus investimentos no país sabendo que os leilões vão acontecer", declarou o deputado.

Tão importante quanto os leilões, é a geração distribuída. O ministro comentou que esse tipo de geração já vem crescendo no Brasil e que o país não pode fugir dessa realidade. "Já foi feito um comunicado do Ministério de Minas e Energia para o Ministério das Cidades falando da questão do FGTS para que possa ser uma das fontes de financiamento desse segmento", afirmou. A fonte solar distribuída ainda pode ser utilizada, segundo o ministro, para gerar energia nos sistemas isolados, que hoje tem uma das energias mais caras do mundo.

A expectativa da Absolar, segundo Colaferro, é que a fonte chegue em 2024 com 7 GW de capacidade instalada na geração centralizada. Até o momento já foram contratadas 99 usinas, que somam 3,3 GW. Os projetos estão distribuídos pelos estados da Bahia, Minas Gerais, Piauí, Ceará, Tocantins, Goiás, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte. Até 2018, são esperados investimentos de R$ 12,5 bilhões. Na geração distribuída, 3.565 sistemas de micro e minigeração estão instalados no país, sendo quase a totalidade, 3.494 sistemas, de solar fotovoltaica. O número, segundo a associação, representa 0,005% das 77 milhões de unidades consumidoras do Brasil, o que evidencia o potencial de crescimento desse tipo de geração. 
Cálculos da associação mostram ainda que o potencial técnico da fotovoltaica no Brasil alcança 28.519 GW na geração centralizada e 164,1 GW na distribuída, já excluindo áreas sensíveis como a Amazônia, o Pantanal, a Mata Atlântica, unidades de conservação, terras indígenas e comunidades quilombolas. Colaferro disse que já estão instalados no país cinco fabricantes de módulos fotovoltaicos, além de vários outros materiais, como inversores e rastreadores. 

Os Estados também têm um papel importante na promoção das fontes renováveis. Por isso, o Fórum Nacional de Secretários de Energia criou um grupo de trabalho para a solar. O GT vai ser coordenado pelo secretário de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco, Thiago Norões. O grupo tem como objetivo não apenas compartilhar experiências e as melhores práticas, como também contribuir para o enfrentamento de problemas e a busca de soluções junto aos outros agentes, como o governo federal. "Vemos o GT com muito otimismo", afirmou Norões. 
Além disso, os Estados vêm trabalhando para atrair tanto projetos como a cadeia de equipamentos da energia solar, que geram emprego e renda. Rodrigo Sauaia, da Absolar, lembra que o Brasil tem o recurso bem distribuído ao longo das regiões, o que faz com que ela seja viável em diversas localidades. Na tentativa de atrair os investidores, o principal incentivo dado pelos estados é a isenção de impostos. A Bahia, inclusive, está contratando um projeto para identificar o potencial e os locais em que a incidência solar é melhor. "A princípio, a melhor irradiação está no semiárido da Bahia, em uma área de mais de 370 mil km². O semiárido é o maior desafio para o desenvolvimento econômico e social da Bahia", comentou o secretário de Desenvolvimento Econômico do estado, Reinaldo Sampaio. Ele disse ainda que a Bahia é responsável por 35% de toda a energia solar centralizada produzida no Brasil.
No Rio Grande do Sul, a ideia, conta Arthur Lemos, secretário-adjunto de Minas e Energia, é ter um polo de fabricação dos painéis, que possa inclusive, ser exportador para outros países. "Nós já estamos em tratativas com duas empresas de montagem de painéis, que querem se colocar no Rio Grande do Sul, mas estamos dependendo da demanda", comentou o executivo. Lemos não pode dizer quais são as empresas, mas contou que uma é espanhola e outra é italiana. "Queremos aproveitar que a Argentina está lançando um projeto renovável e nós, estando muito próximos, tendo fronteira com a Argentina, possamos fazer esse encaminhamento desses equipamentos para o país vizinho", apontou.

O estado de Pernambuco, primeiro a realizar um leilão solar em 2013, trabalha, segundo o secretário Tiago Norões, para criar o melhor ambiente de negócios possível para os investidores. O estado já assegurou a isenção de ICMS para projetos e todas as etapas da cadeia de energia solar, eólica e biomassa. "Queremos trazer a indústria para o estado. Sabemos que essa é uma indústria de futuro, com muita tecnologia. Do ponto de vista fiscal, fomos ao máximo até onde poderíamos ir", afirmou.
O Brasil, realmente, é privilegiado quando o tema é geração solar. O futuro presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Luiz Barroso, lembrou que o pior lugar do Brasil para energia solar é melhor que o melhor lugar da Alemanha. "A solar tem três mecanismos de contratação: através do mercado livre, dos leilões de expansão e dos leilões de Reserva", apontou Barroso. Ele explicou que o LER foi criado como consequência do racionamento e como possibilidade de contratação para energia de emergência. "Mas ele tem sido usado para testar novas tecnologias", declarou. Ele explicou ainda que a demanda para a contratação no LER não é aleatória, ela vem para corrigir a garantia física das hidrelétricas para evitar mudar o papel dessas usinas.

O diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico, Luiz Eduardo Barata, pediu um alinhamento entre o planejamento da expansão e da operação. "O desalinhamento torna a operação mais cara. O planejamento precisa estabelecer qual a matriz que a gente quer no país e os leilões tem que ir nessa direção", defendeu. Para o executivo, a transmissão é o maior problema que o país enfrenta atualmente e o ideal é dispor de fontes que possam ser instaladas próximas ao centro de consumo, como a solar. "Podemos ter sites com solar e eólica, que compensa os problemas de intermitência", apontou ao ser questionado sobre a irregularidade dessas fontes. Enquanto a solar gera de dia, a redução dessa geração à noite pode ser compensada pela maior disponibilidade eólica.
Secretários estaduais e deputado Fábio Garcia debatem políticas para a fonte
Barata defendeu ainda a figura do comercializador varejista, que mesmo após três anos da sua implantação, ainda não teve uma atuação efetiva. "Temos que resolver isso, porque essa figura é muito importante para a fonte solar", destacou. O presidente do Conselho de Administração da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, Rui Altieri, explicou que a judicialização do setor elétrico é uma das barreiras para a atuação do comercializador varejista, pois há uma preocupação de que uma decisão judicial impeça o corte de clientes inadimplentes.

"O problema é se a justiça determinar que não seja realizado o corte e isso se arraste por meses", declarou Altieri. "O Brasil tem que caminhar para uma relação comercial", completou o executivo, frisando que se houver inadimplência em outro tipo de serviço, o produto não será entregue, mas que no caso da energia, muitas vezes a justiça determina a continuidade do fornecimento. Ele explicou que, no caso da solar, o comercializador varejista funcionaria como um agregador tanto de carga como de geração. "Ele reúne um grupo de geradores de pequeno porte, agrega toda essa geração e comercializa esse portfólio", disse. Essa figura seria ainda mais importante na geração distribuída, ficando responsável por vender o excedente da energia.

O problema das novas renováveis como a eólica e a solar reside na questão do armazenamento da energia. Por não terem como armazenar a produção, ela precisa ser utilizada no mesmo momento da geração. Caminhando nessa direção, a Agência Nacional de Energia Elétrica começará a estudar as tecnologias disponíveis para o armazenamento dessas energias. A agência vai abrir em breve uma chamada pública de P&D Estratégico sobre o tema para que as empresas possam investir nesse segmento através dos recursos de P&D. "Estamos aguardando as respostas de outros países que estão investindo pesado em armazenamento. Isso para não onerar a sociedade brasileira", afirmou o diretor da Aneel, André Pepitone, ao explicar porque só agora o Brasil resolveu incentivar as pesquisas no tema. 

Ele lembrou que o Brasil é um dos países com a regulação mais avançada no que se refere a micro e minigeração, com a publicação da resolução 482 e, posteriormente, sua atualização, na resolução 687. Apesar disso, Sauaia, da Absolar, diz que o país ainda precisa avançar na tributação e na questão de financiamento dos pequenos projetos. Na tributação, diversos estados já aderiram ao Convênio Confaz 16, que isenta projetos de microgeração de ICMS, PIS e Cofins.
Autoridades debatem o segmento de energia solar durante o evento 
No que diz respeito ao financiamento, apesar de já existirem linhas para a fonte solar, os bancos públicos ainda não emprestam dinheiro para pessoas físicas instalarem painéis fotovoltaicos. "Temos uma situação complexa porque as pessoas físicas não conseguem financiamento. A Absolar propõe que bancos públicos como a Caixa Econômica, o Banco do Brasil e o Banco do Nordeste tenham linhas para a fonte", pleiteou Sauaia.

Ele reconheceu que houve um avanço no que diz respeito ao financiamento com a estruturação do FNE Sol do BNB para projetos de micro e minigeração renovável distribuída. Os recursos vem do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste. "O problema é que a área é limitada a Sudene, não atingindo o país todo, e ele é voltado para empresas", esclareceu o presidente executivo da Absolar. A área da Sudene engloba o norte de Minas, o norte do Espírito Santo e todo o Nordeste.

Em breve as pessoas físicas deverão ter uma linha de financiamento do BNB. José Rubens Dutra Mota, gerente de Ambiente de Políticas de Desenvolvimento do Banco do Nordeste, contou que deverá ser lançado ainda este ano o CDC - Crédito Direto ao Consumidor. Além disso, o banco ainda terá uma linha que beneficia agricultores familiares, ligada ao Pronaf. "Nós começamos a trabalhar os três produtos. O FNE Sol saiu, já foi lançado. O CDC nós estamos tirando algumas dúvidas da parte do banco como um todo, garantias, taxas, e o Pronaf depende do plano Safra, no que diz respeito aos equipamentos importados ou não", explicou o executivo.

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