A geração controlada e regular de energia por meio da fusão nuclear, com a conversão de hidrogênio em hélio, reproduzindo na Terra, em pequena escala, o que ocorre no Sol e em outras estrelas, é uma das grandes promessas tecnológicas para as próximas décadas.
Indo muito além dos resultados já obtidos há tempos em laboratórios, um protótipo de reator, o ITER – cujo nome significa “o caminho”, em latim –, capaz de gerar 500 megawatts de energia, está em construção no sul da França e deverá entrar em operação em 2025.
China, União Europeia, Índia, Japão, Coreia do Sul, Rússia e Estados Unidos participam do megaprojeto, cujo custo deverá ultrapassar a marca de € 20 bilhões.
O ITER não fornecerá energia para a rede elétrica, mas será o primeiro equipamento do tipo tokamak – termo formado pelo acrônimo da expressão em russo para “câmara toroidal com bobinas magnéticas” – em que a energia gerada será maior do que a energia necessária para colocá-lo em funcionamento. Assim, possibilitará testar as múltiplas complexidades técnicas inerentes ao processo e servirá de modelo para máquinas semelhantes.
Para que tudo isso dê certo, porém, existe uma questão crucial: garantir que o processo de fusão nuclear se torne autossustentável, impedindo que a perda de energia por meio de radiação eletromagnética e do escape de partículas alfa – o núcleo atômico do hélio, formado por dois prótons e dois nêutrons – desaqueça o reator.
Resultados experimentais observados ao longo dos 20 últimos anos mostraram que a forma pela qual os íons rápidos (dentre os quais as partículas alfa) são ejetados do plasma varia muito entre diferentes tokamaks. E ninguém compreendia quais condições experimentais determinavam esse comportamento.
O problema foi elucidado agora por um jovem pesquisador brasileiro, Vinícius Njaim Duarte, recém-doutorado com Bolsa da FAPESP e Bolsa de Pesquisa no Exterior e atualmente realizando trabalho de pós-doutoramento no Princeton Plasma Physics Laboratory, nos Estados Unidos.
Duarte foi o autor principal do artigo Theory and observation of the onset of nonlinear structures due to eigenmode destabilization by fast ions in tokamaks, publicado com destaque pela revista Physics of Plasmas, do American Institute of Physics (AIP).
A repercussão de seu trabalho foi tanta que, no maior tokamak dos Estados Unidos, o DIII-D, desenvolvido e operado pela General Atomics em San Diego, Califórnia, foram realizados experimentos dedicados a testar o modelo por ele proposto. E os resultados experimentais confirmaram as predições do modelo.
“Ondas eletromagnéticas excitadas por partículas rápidas em tokamaks podem apresentar variações bruscas de frequência que, em inglês, são chamadas de chirping [chilreio]. Não se compreendia por que em algumas máquinas isso aparecia e em outras não.
Usando modelagem numérica bastante complexa e dados experimentais, Duarte mostrou que a produção ou não do chirping – e, portanto, o caráter da perda de partículas e energia – depende do nível de turbulência do plasma existente no interior do tokamak, no qual estão ocorrendo as reações de fusão nuclear.
Se o plasma não for muito turbulento, o chirping acontece. Mas, se for muito turbulento, não”, disse o físico Ricardo Magnus Osório Galvão, atual diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que foi o orientador do doutoramento de Duarte no Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IFUSP).
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