Privatização da Eletrobras retira recursos do país e pode aumentar conta de energia, dizem debatedores


A privatização da Eletrobras, em discussão na Câmara dos Deputados, retirará recursos estratégicos do país e deve gerar aumento nas tarifas de energia elétrica para o consumidor, de acordo com participantes de audiência pública feita nesta quinta-feira (14) pela Comissão Senado do Futuro (CSF). O objetivo foi discutir o PL 9.463/2018, que regulamenta a desestatização do setor de energia no Brasil.

Na prática, o projeto permite que mais ações da Eletrobras sejam colocadas no mercado à disposição de investidores privados, fazendo com que a participação da União na estatal fique menor. Outro texto (PL 10.332/18), também em análise na Câmara, viabiliza a venda de seis distribuidoras da Eletrobras nas regiões Norte e Nordeste.

Agenor de Oliveira, representante da organização não governamental Instituto Ilumina, afirmou que a hidroeletricidade, em qualquer lugar do mundo, é estatal. De acordo com o especialista, o único país a privatizar o setor foi o Japão, onde essa matriz representa apenas 7% do total. Para ele, manter a hidroeletricidade nas mãos do Estado não é uma questão de ideologia, mas de segurança.

— Se fosse ideológica, nos Estados Unidos seria diferente do que ocorre na Rússia, e não é. Nem os russos nem os americanos privatizam sua hidroeletricidade por uma razão muito simples: o provimento da energia elétrica é uma política de Estado, não de governo, circunstancial. A política energética tem como objetivo fundamental dar segurança energética para as pessoas a preços razoáveis, que possibilitem o desenvolvimento desses países — argumentou.

O Diretor de Distribuição da Companhia Energética de Brasília (CEB), Mauro Martinelli, lembrou que os reservatórios permitem o armazenamento da água e a geração de energia no momento mais adequado e não de maneira intermitente, de acordo com a natureza, como acontece, por exemplo, com a energia solar e a eólica.

— A Eletrobras tem 50% dos reservatórios brasileiros. Imagine o poder que uma empresa como essa vai ter, num momento de transição em que estamos aumentando a geração solar e eólica e necessitamos da energia firme dos reservatórios? É por isso que o Brasil não pode, em hipótese alguma, abrir mão de continuar com a Eletrobras estatal — defendeu.

Tarifas

O representante do Instituto Ilumina lembrou também que a privatização de empresas do setor elétrico ocorrida nos anos 1990 gerou aumento de tarifas. Ele disse que o brasileiro paga a quinta tarifa mais alta do mundo. Quando se inclui a renda, a comparação fica ainda mais desfavorável. De acordo com o especialista, o Brasil é o pais em que o cidadão precisa trabalhar mais horas para pagar 1MW/h de energia: são 111 horas, contra 16 do Canadá, que também tem um sistema com predominância da hidroeletricidade.

Fabiola Latino Antezana, representante do Coletivo Nacional dos Eletricitários, prevê aumento na conta de energia após a privatização e diz que todas as mudanças propostas são para atender ao mercado. Para ela, a Eletrobras tem que ser vista não só como empresa, mas como uma transferidora de recursos entre regiões, com capacidade para reduzir desigualdades regionais.

Leandro Caixeta Moreira, que representou a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) no debate, explicou que, na situação atual, as únicas soluções seriam manter a Eletrobras como empresa e mudar o controle societário, como está sendo feito, ou licitar somente a concessão do serviço de distribuição, o que exigiria a criação de uma nova empresa e a liquidação da Eletrobras.

Consumidor

De acordo com o representante da Aneel, a parte do debate que cabe à agência reguladora é a alocação da renda hidráulica, diferencial entre o preço de mercado e o custo efetivo da energia, amortizado o investimento feito nas usinas hidrelétricas. Para ele, a forma como a descotização da Eletrobras está prevista no projeto pode, sim, gerar aumento nas tarifas de energia porque apenas uma pequena parte dessa renda será usada para baixar as tarifas para o consumidor.

— Na nossa visão a maior parte dessa renda hidráulica deveria ser usada para aliviar a tarifa e a conta para o consumidor. Pode fazer a descotização? Pode, desde que se aloque a maior parte da renda hidráulica na CDE [Conta de Desenvolvimento Energético], por exemplo, e diminua os encargos setoriais.

A Conta de Desenvolvimento Energético é um fundo setorial que pode custear diversas políticas públicas do setor elétrico brasileiro, como a universalização do serviço de energia elétrica, a concessão de descontos tarifários a usuários do serviço e a modicidade da tarifa em sistemas elétricos isolados.

O presidente da comissão, senador Hélio José (Pros-DF), anunciou ter recolhido as assinaturas de 42 senadores para a criação da CPI do setor elétrico. A intenção é investigar possíveis irregularidades no processo de privatização da Eletrobras.

Fonte: Agência Senado

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