Nissan financia pesquisa na Unicamp para eletrificar etanol


Universidade vai pesquisar viabilidade para uso do biocombustível como uma opção para a mobilidade elétrica.

A Nissan assinou nesta sexta-feira, 26, acordo com a Unicamp para financiar pesquisas com o objetivo de ampliar o uso do etanol na eletrificação veicular. Em uma primeira fase, nos próximos quatro meses, o Laboratório de Genômica e Bioenergia (LGE) da Universidade Estadual de Campinas vai produzir um estudo que aponta a viabilidade e tendências da utilização do etanol na etromobilidade. 

Segundo Marco Silva, presidente da Nissan no Brasil, existe especial interesse em investigar a produção de etanol de segunda geração, que pode ser produzido a partir de material celulósico, como bagaço e palha de cana ou outros tipos de plantas. Inicialmente, a ideia é voltar a fazer testes de rodagem no País com a van EV200 SOFC, veículo elétrico equipado com um catalisador que extrai hidrogênio do etanol para alimentar sua célula de combustível, um gerador eletroquímico que produz eletricidade com injeção de hidrogênio e ar, emitindo na atmosfera apenas vapor d’água. 

O protótipo já esteve no País em 2016 e 2017, quando rodou abastecido em postos regulares com o etanol brasileiro. Depois dessa experimentação, o protótipo voltou ao Japão e agora deverá ser trazido novamente para trafegar com o etanol de segunda geração. “Estudamos várias fontes energéticas para eletrificar nossos veículos. Fizemos aqui testes bem-sucedidos com nosso SOFC e até agora o etanol se mostrou a solução mais barata e eficiente”, afirmou Hirofumi Eta, diretor de engenharia de produto da Nissan no Brasil. 

O protótipo Nissan NV200 SOFC que em 2017 rodou pelo Brasil com etanol para gerar hidrogênio e eletricidade

“É importante destacar que este é um desenvolvimento brasileiro para o mundo, que coloca o etanol como alternativa energética de eletrificação. Nossa engenharia no Japão tem grande interesse em incluir essa solução brasileira na construção de uma matriz energética sustentável”, disse Marco Silva.

O executivo também informa que, na mesma linha de ação, está no horizonte a introdução de um gerador flex (bicombustível gasolina-etanol) no powertrain híbrido e-Power, que combina tração 100% elétrica com motor a combustão para gerar energia. Silva já havia dito que a Nissan estuda introduzir esse tipo de tecnologia em modelos produzidos no País e o candidato número um para isso é o SUV compacto Kicks. Esta solução ganhou mais força com a criação de incentivos para carros híbridos flex no programa Rota 2030, que prevê o desconto de três pontos porcentuais de IPI para veículos equipados com esse tipo de propulsão. 

No entanto, Silva garantiu que neste primeiro momento o estudo em curso com a Unicamp “não tem nada a ver com incentivos do Rota 2030, estamos investindo recursos próprios para ampliar as possibilidades de uso do etanol no powertrain elétrico”, disse. “Não podemos olhar a eletrificação de uma só forma, precisamos estudar as várias alternativas de eletrificação”, acrescenta. 

INTERNACIONALIZAÇÃO DO ETANOL

Segundo o professor titular do LGE da Unicamp, o geneticista Gonçalo Pereira, que vai coordenar os estudos da Unicamp com a Nissan, combinar o etanol com a eletrificação seria atualmente o melhor caminho para internacionalizar o biocombustível e transformá-lo em uma commodity negociável em bolsas de mercadorias. 

“A eletrificação abre espaço para a globalizar do etanol”, avalia o professor Gonçalo Pereira.

Ele explica que atualmente há tecnologia para multiplicar várias vezes a produção de etanol no Brasil e no mundo, com o cultivo de plantas alternativas e evolução do processo de extração do etanol celulósico. “Como exemplo, Pereira cita a cana-energia, uma espécie de cana com caule duro que tem alta concentração de açúcar celulósico, não solúvel, que ele chama de “dinossauro da cana”. Segundo ele, enquanto no Brasil a produtividade da cana comum, “que já é a mais elevada do mundo”, é de 80 toneladas por hectare, enquanto a cana-energia produz três vezes mais, cerca de 240 toneladas por hectare. 

“O que vamos fazer com a Nissan é apontar quais são as tendências e as melhores alternativas para produção e uso de etanol em veículos eletrificados, especialmente com célula de combustível”, explica Pereira. “O etanol de segunda geração já é viável, o que falta é criar demanda e escala econômica para ele, como fizemos com o carro a álcool nos anos 80, quando saímos de quase zero para a produção de 10 bilhões de litros de etanol por ano, com o flex saltamos para além de 30 bilhões, com a célula de combustível e o etanol de segunda geração poderíamos passar dos 100 bilhões”, calcula. 

Visto dessa forma, o horizonte do etanol parece bastante promissor. O biocombustível de cana já é a fonte energética líquida mais limpa disponível, mesmo quando é integralmente queimado em motores a combustão interna, pois mais de 90% de suas emissões de CO2 são reabsorvidas pela própria plantação de cana. A combinação com a eletrificação em carros híbridos ou com célula de combustível só eleva a vantagem ambiental do etanol, pois aumenta sua eficiência. 

Espera-se, por exemplo, que o novo Toyota Corolla híbrido flex, que será produzido no Brasil no segundo semestre, tenha desempenho superior a 15 km/l. A tecnologia da célula de combustível é ainda mais eficiente, pois o etanol não é queimado, mas reformado quimicamente para extração do hidrogênio a ser injetado nas células para geração de eletricidade. O protótipo SOFC da Nissan apresentou autonomia de 20 a 25 quilômetros por litro de etanol reformado. Esse processo emite menos de um terço de CO2 produzido por um motor a combustão e o gás pode ser totalmente reabsorvido. Mais: o etanol é o segundo combustível mais eficiente para extração de hidrogênio por reforma química (só perde para o metanol) e por isso tem emissão ainda mais baixa. 

Outro uso sustentável do carro elétrico equipado com célula de combustível é que ele pode se transformar em um gerador doméstico de energia. Ao colocar o veículo na garagem, ele pode ser plugado na tomada, não para ser recarregado, mas para produzir eletricidade para uma residência ou fornecer esse excedente a uma rede pública inteligente. 

O que falta resolver é o até agora alto custo da célula de combustível, que vem caindo ao longo dos últimos 20 anos de pesquisa, mas ainda não o suficiente para se tornar viável economicamente. Nesse contexto, a pesquisa em conjunto da Nissan com a Unicamp irá identificar como o etanol pode contribuir para tornar a tecnologia mais acessível. 

VEJA COMO FUNCIONA O PROTÓTIPO NISSAN SOFC


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