Bombas de combustível e carros abastecendo no pátio. Sobre o “teto” do posto, painéis fotovoltaicos garantem a energia – e economia – para fazer toda a estrutura funcionar. O Eco Posto Amigão, na zona Sul de Natal, é, segundo o empresário Emídio Melo, o primeiro do país a adotar sistema de geração de energia solar e os resultados refletem no caixa da empresa: uma redução de 90% na conta de luz, que chegava a R$ 3 mil por mês em outubro do ano passado.
“Vi essa tecnologia sendo usada em outros países e pensei porque não em Natal que temos sol ano inteiro? O investimento já se reflete em economia grande e em oito anos tiramos esse valor. Agora em setembro vou pagar R$ 150,00, ou seja, 5% do que pagava antes”, conta o empresário.
O sistema – formado por 84 placas fotovoltaicas, inversores (que transformam a energia gerada de Corrente Contínua para Corrente Alternada) e medidor bidirecional ligado diretamente na rede elétrica – custou R$ 130 mil e gera o equivalente ao consumo médio diário de 100 kW fazendo a conta despencar para menos de R$ 300 ao mês – 10% do valor antes do sistema. “O projeto foi planejado para 90%, mas dependendo da irradiação gero mais ou menos e isso se equilibra. E em caso de ter crédito posso compensar até em outro endereço, se quiser, pelo mesmo CPF”, observa o empresário. Os painéis abastecem a pista de bombas, escritório, conveniência, praça de alimentação e lojas do posto.
Assim como Emídio Melo mais usuários tem optado por gerar a própria energia. No Rio Grande do Norte, o número de unidades geradoras de energia fotovoltaica conectadas ao sistema elétrico da Cosern cresceu 4 vezes em pouco mais de um ano, segundo dados da Companhia Energética do RN (Cosern). Passando de 23 unidades geradoras [no primeiro quadrimestre de 2015] para 109 em julho deste ano – sendo 73 delas residenciais.
Ao todo, as 109 unidades [96 microgeradores e 13 minigeradores] geraram no mês de julho aproximadamente 85 mil kWh, o que representa cerca de 0,02% do consumo mensal de todo o estado. Até agosto, já são 145 projetos aprovados de energia solar junto a Cosern (94 residenciais), o que demonstra o crescimento por esta fonte de energia.
O aumento crescente do interesse nesta tecnologia se deve aos ganhos ambientais e principalmente financeiros para as empresas, observa o economista José Maria Vilar, consultor da JVilar Consultoria Empresarial Ltda., empresa que presta consultoria técnica e de crédito para instalação de sistemas de geração de energia solar fotovoltaica em empresas e também residências.
Economia
A economia gira em torno de 90% já a partir da primeira conta ao completar um ciclo inteiro de medição após a instalação do sistema e com previsão de resgate do investimento no prazo entre cinco a oito anos. A cobrança – apenas da diferença entre o que gerou e o que consumiu – é feita normalmente pela concessionária e havendo crédito a ser compensado no prazo de até 5 anos.
A economia foi o que atraiu o funcionário público Willian Rocha, 45 anos, que decidiu há um ano e meio instalar as placas fotovoltaicas no teto de casa. Todo o consumo com iluminação, quatro aparelhos de ar condicionado e uso de aparelhos eletroeletrônicos é da família é feito com geração própria. O investimento de R$ 17 mil em 12 placas e sem demandar manutenção, segundo ele, deverá ser amortizado em mais 3 anos e meio devido aos aumentos de energia no último ano.
“Considero um investimento a medida que reduzo a conta de energia, antes de R$ 450 para R$ 160, em junho, que não usamos o ar condicionado foi ainda muito menor. E o sistema se integra a casa”, conta Willian Rocha.
Investimento vale a pena dependendo do consumo
Apesar de poder reduzir para cerca de 10% o valor da conta, é preciso avaliar o porte e o consumo antes de optar em gerar a própria energia. Segundo as empresas de instalação, devido o investimento ainda ser considerado alto – a partir de R$ 15 mil para sistemas residenciais e a partir de R$ 26 mil para empresas, dependendo do tamanho e demanda – em geral, a instalação é recomendada para contas a partir de R$ 300 mensais.
O diretor geral da Enerbras, empresa especializada em sistemas de geração de energia fotovoltaica, Helder Ferreira observa que, mesmo com a recessão da economia, a procura por sistemas de geração fotovoltaica se mantém. A empresa responde por 40 projetos de micro e minigeração em residências, padarias, postos de gasolina, escolas e outros empreendimentos na região Nordeste e mantem uma usina, na sede em Ponta Negra. “Energia elétrica é um dos insumos mais altos no custo de produção de qualquer empresa. A possibilidade de economia proporcionada com a geração própria é a principal razão da busca ser constante”, diz.
A economia é constatada na conta de luz do mês seguinte ao início da operação e o tempo de retorno do investimento é estimado em oito anos. “Para casas com contas inferiores a R$ 200 o investimento inicial de 15 mil não compensa, acima desse valor de conta, sim é vantajoso”, esclarece ele. Com o avanço da tecnologia, ele afirma que o preço do sistema de placas já caiu cerca de 80% em dez anos.
Além disso, acrescenta José Maria Villar, da JVilar Consultoria Empresarial Ltda., optando pela energia solar distribuída, o consumidor – residencial ou empresarial -, fica livre dos reajustes futuros nas contas de energia elétrica, proporcionando o domínio sobre os custos desse insumo.
Por mais que a geração do mês ou a soma desta com créditos remanescentes seja suficiente para abater integralmente o consumo, a fatura, porém, não é “zerada”, devido a cobrança de taxas mínimas de consumo e iluminação pública por parte da Cosern.
Procura por crédito sobe em bancos públicos e privados
A demanda para instalação de energia solar em empresas e residências cresce e impulsiona a busca por crédito nos bancos.
De janeiro a 15 de agosto, o Banco do Nordeste fechou 15 operações para fotovoltaica, que somam pouco mais de R$ 3,6 milhões com a linha FNE Sol e há em prospecções R$ 11,7 milhões.
O FNE Sol é constituído com recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste para energias renováveis. Era o FNE Verde, que financiou cerca de R$ 10 milhões para investimento no Rio Grande do Norte.
“A procura pelos financiamentos do FNE Sol é crescente. Somando projetos contratados e em prospecção, temos R$ 17,5 milhões. E isso só para a energia fotovoltaica. Podemos fechar 2016 com mais que o dobro do ano passado pela linha do FNE Verde, que incluía outras fontes de geração”, afirma o superintendente regional José Mendes Batista.
O Banco Santander projeta financiar, em todo o país, 1 mil sistemas fotovoltaicos até o final do ano – sendo 60% para pessoa física e 40% empresas. Dentro da linha para projetos fotovoltaicos de financiamento a energias renováveis que, em 2015, alcançou cerca de R$ 86 bilhões. O banco não informa dados por estado.
O Banco do Brasil dispõe de linhas linhas de crédito Proger Urbano Empresarial e Proger Turismo Investimento que podem ser usadas para os investimentos de micro e pequenas empresas (com faturamento anual até R$ 25 milhões) em sistemas de geração e redistribuição de energia elétrica a partir da energia solar (fotovoltaica) ou eólica. Em 2016, até o momento, são R$ 322,2 milhões e contratadas 4.036 operações em crédito concedido para as finalidades de investimento abrangidas pelas linhas, incluindo aquisição de tecnologias renováveis.
Desafios
Apesar de existir, o crédito para geração de energia solar, segundo empresas, ainda é restrito. “Poucos bancos tem linhas próprias para energia solar. Os demais, tem outras linhas que se o cliente quiser pode financiar, mas é preciso que abram as financiamento específicos para que tenha melhores condições de prazo, taxas de juros”, afirma Helder Ferreira, da Enerbras.
O diretor da Injesolar, empresa de instalação de sistemas fotovoltaicos que atua há dois anos no mercado potiguar, Alexandre Lopes da Silva, explica que empresas buscam mais gerar a própria energia na tentativa de baratear os custos.
“Com o sistema, a prestação do financiamento fica em torno de R$ 2,5 mil equivalente a conta de energia de algumas empresas e amortizado ao final de 6 anos”, afirma.
Segundo Alexandre, o prazo entre projeto e instalação leva cerca de 3 meses – sem contar o prazo para aprovação do financiamento pela instituição bancária. “Muitos bancos só cobrem 70% do valor do projeto total e pedem garantia real, que apresente imóveis, o que tem dificultado o acesso”, disse.
Condições oferecidas
Veja detalhes sobre a oferta de crédito em alguns bancos:
- BNB
As condições para acesso ao crédito do FNE Sol incluem prazo de pagamento de até 12 anos, com até um ano de carência; financiamento de até 100% do investimento e bônus de adimplência de 15%. A linha de financiamento é destinada a empresas de todos os portes e setores, produtores e empresas rurais, cooperativas e associações. Podem ser financiados sistemas completos envolvendo geradores de energia, inversores, materiais auxiliares e instalação.
- Banco do Brasil
As as linhas de crédito Proger Urbano Empresarial e Proger Turismo Investimento para empresas que faturam até R$ 10 milhões por ano, financiando até 80% do valor do projeto. O limite é de até R$ 1 milhão por empresa com taxa de juros a partir de TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) mais 4,50% ao ano (equivalente a 0,97% ao mês – taxa mínima). E prazo de pagamento de 72 meses, com até 12 meses de carência, para o Proger Urbano Empresarial. Já para o Proger Turismo Investimento, 120 meses, com carência de até 30 meses.
- Santander
Linha de crédito especifica para financiar maquinas, equipamentos e projetos que promovam eficiência energética e a produção de energia renovável. Ela tem prazo de até 60 meses, com carência de até 3 meses, taxa que gira em torno de 2,2% a.m. e é contratada diretamente na empresa que fez/ofertou o projeto ao cliente final – com 157 fornecedores credenciados.
Estruturar a cadeia é um dos desafios
O Rio Grande do Norte também tem ‘geração em escala’ de energia solar (parques e usinas). Uma das vantagens para a geração em escala é que o Estado já dispõe de infraestrutura de linhas de transmissão nos parques eólicos que poderão ser usados para instalações das usinas de solar. Mas é preciso avançar na infraestrutura de estradas e portuária para reduzir custos e promover incentivos fiscais para atração de indústrias de grande porte para o Estado.
A ampliação da geração de energia solar no país também ainda enfrenta o preço do quilowatts/hora mais caro em relação ao de outras fontes de energia e, ao contrário do visto com e energia eólica, este segmento não esteve programas de subsídios como o ProInfa e Proeolica.
O setor de geração de energia solar também sentiu o “pé no freio” com a crise econômica, segundo o coordenador de gestão de dados e estatísticas setoriais do Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energias Renováveis (Cerne), João Agra Neto. Muitos dos investidores seguraram os recursos e a participação em leilões reduziu, bem como a oferta de crédito para o setor.
“Ano passado, com a crise, os bancos enxugaram os financiamentos, o volume de investimentos caiu. Mas já começa a liberar novas linhas. O recurso natural existe e é preciso desenvolver a cadeia produtiva”, disse Agra.
Políticas
Um mapeamento da cadeia produtiva de energia solar e a implementação de políticas públicas para o setor são algumas das necessidades apontadas pela gerente Unidade de Desenvolvimento da Indústria no Sebrae-RN, Lorena Roosevelt, para que a geração no estado avance à exemplo do corrido com a energia dos ventos.
Tais medidas devem ser prioritárias, frisa ela, para aumentar a competitividade do Rio Grande do Norte em relação a estados vizinhos.
“As políticas de incentivo fiscal, melhorias de infraestrutura e logística foram adotadas nos estado de Pernambuco, Bahia e em Minas Gerais que estão a frente da geração. É preciso melhorar mais a participação do estado por meio de iniciativas como estas”, destaca.
O Sebrae, segundo ela, está em fase de prospecção para desenvolver consultoria em energia solar e realizar estudo similar ao feito com a eólica e lançado no ano passado. “A ideia é mapear oportunidades, vendo como inserir as micro e pequenas empresas nesta cadeia produtiva e criar meios do estado crescer neste setor”, explica Lorena Roosevelt.
BATE PAPO
Paulo Fernando Isabel dos Reis – Diretor de Tecnologias do CTGAS-ER
Como o senhor avalia a geração de energia solar no RN?
O Rio Grande do Norte é um dos Estados do Brasil atualmente com grandes investimentos na área de renováveis, especificamente em energia eólica. Isso mostra um interesse no Estado em se destacar nessa indústria e inserir a cadeia fotovoltaica é algo bastante natural. O recurso do Estado na área solar é bastante promissor e viabiliza diversos projetos de implantação de sistemas de geração.
Que vantagens trazem para o Estado?
A Energia solar tem uma vantagem frente às outras tecnologias por ser modular. Isso faz com que possam ser instalados sistemas na ordem de Watts a MegaWatts. Isso gera não somente uma cadeia de fornecimento de equipamentos e materiais, mas também uma série de empregos nas áreas de projetos, instalação, operação em manutenção de sistemas de pequeno e grande porte.
E qual a tendência?
A tendência é que os leilões atraiam uma maior quantidade de fabricantes de componentes, mas há uma grande possibilidade de expansão do mercado de micro e mini geração distribuída, ou seja, a geração que todo consumidor residencial ou comercial já pode ter em suas unidades consumidoras.
Ainda é pequeno o número de geradores, sejam usinas ou micro e mini no RN, por quê?
Os projetos de geração fotovoltaica possuem uma vida útil de aproximadamente 25 anos. Sistemas de geração tem o seu retorno financeiro, ou seja, “pagam-se” em um período entre 6 e 8 anos do investimento. Considerando esses números, tem-se uma geração de receita pelos próximos 19 a 17 anos de funcionamento do sistema. Acredito que o número pequeno de sistema de micro e mini geração se deve à falta de disponibilidade de recurso financeiro para investir em um sistema. Sua viabilidade econômica já é justificada, um dos gargalos são as condições financiamentos específicos para essa aplicação. Tramita no Senado projeto que permite a utilização de recursos do FGTS para aquisição e instalação de sistemas fotovoltaicos que pode contribuir para uma maior disseminação.
Fonte: Tribuna do Norte | Sara Vasconcelos
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